ela vê agora a tela do computador com a imagem da praia, uma água transparente e azul e pensa na vontade de estar lá. outra vez a fuga, cansou das fugas.
cansou tanto das fugas que hoje decidiu não fazer nada, só chorar.
não dava mais pra segurar. não dava mais pra ser a que só dá e não recebe. a paralisia no trabalho, de novo o ônibus, que por sorte ou pelo horário estava vazio. ela conseguiu pegar um lugar lá no fundo, virada pra frente, de costas às vezes enjoa. a vontade era desaparecer, não queria que ninguém olhasse pra ela, só queria chorar, gritar... qualquer coisa fazia seu coração disparar, desde imaginar o telefone tocando e ter que atender, até a briga do senhor mais velho com o mais novo pra ceder o lugar pro mais velho ainda que estava em pé. mas porra, vc não viu que o mais novo estava no seu mundo, escutando música e não viu o mais velho entrar? que culpa ele tem? se é tão velho que ande de táxi e pare de se equilibrar freneticamente no ônibus, ora bolas!
descer do ônibus foi um alívio. chegar em casa, fanta de 3 dias atrás, pão velho com manteiga velha...cerveja? não... melhor o remédio natural/placebo.
e nunca tinha visto as coisas de maneira tão clara, tão ali batendo na sua cara, tão ali, ali na sua frente! e demorou muito pra abrir os olhos.
nunca tinha chorado tão gostoso, tão soluçante, com vontade!
o guardanapo logo ficou cheio de rímel marrom, porque ela não gostava de preto.
cheio de rímel marrom, lágrimas, caca de nariz...até ficar aquele papel molinho, úmido e suado.
a boca até tremia de tanto falar verdades. pra ela mesma. tinha que ouvir. tinha que falar e ouvir a ela mesma, mesmo que a outra falasse, ela tinha que se ouvir sozinha.
as coisas começavam a fazer sentido então. tudo.
o bom de tudo isso é que ela se deu conta. se deu conta do que precisava fazer. fazer, chega de falar e falar e falar.
mas não era isso que eu queria falar, boa noite.
(qualquer semelhança com a realidade é mera decadência)